Acto! Encontro de Teatro
O ACTO! – ENCONTRO DE TEATRO reúne companhias teatrais brasileiras para mostrar seus espetáculos e, principalmente, trocar experiências criativas. O Espanca! é o anfitrião desta reunião, concebida para ser, ao mesmo tempo, um festival de teatro e um encontro íntimo entre grupos amigos sediados em estados brasileiros distintos. O projeto é fruto do desejo de radicalizar o intercâmbio e a colaboração na criação; de transformar-se a partir da troca; de realizar um evento na perspectiva de grupos teatrais; de criar um intercâmbio que identifique, diferencie e reinvente seus convidados; e, ao mesmo tempo, do desejo de compartilhar isso tudo com as pessoas interessadas em participar deste Encontro. Por meio de apresentações de espetáculos, demonstrações de trabalho e conversas entre amigos, o ACTO! espera aliar prática, teoria e reflexão para criar um espaço íntimo de trocas de impressões sobre o teatro, sobre o mundo e sobre nós mesmos.
Sejam bem-vindos a este encontro, sejam bem-vindos ao outro.
A 1ª edição do Encontro, realizada em parceria com a Agentz Produções, aconteceu em Belo Horizonte, entre 19 e 22 de abril de 2007, no Teatro Dom Silvério, no Museu Mineiro e no Espaço Ambiente. O ACTO1! reuniu o Espanca!, a Companhia Brasileira de Teatro (PR) e o Grupo XIX (SP) sob a mediação do professor e crítico teatral Kil Abreu. Cada coletivo apresentou um espetáculo de seu repertório (Por Elise, Hysteria e Suíte1) e propôs aos demais presentes uma tarde de diálogo sobre sua história e seus processos de criação. Por meio de apresentações de espetáculos, demonstrações de trabalho e conversas, parceiros e pensadores foram convidados a refletir sobre o teatro que fazemos no Brasil hoje, mesmo com caminhos estéticos distintos.
carta de abertura do acto1!Belo Horizonte, 19 de abril de 2007.
Os princípios que guiam a criação artística são diversos e ilimitados. Dar inícioao processo de construção de uma obra é percorrer um caminho visível aospoucos. Por melhor que seja o planejamento e a elaboração do roteiro, os riscossão inevitáveis (e imprescindíveis!) quando se propõe dialogar coletivamente.O espetáculo “acontece” como parte do acúmulo de conhecimentos, escolhas,sensações e intuições de todos os artistas envolvidos na cena.
Buscamos entender a natureza do nosso teatro. “Natureza” é a condição do homemantes mesmo da civilização. Buscamos entender o que está por trás da civilidadedo teatro que nós fazemos, da forma como nos ordenamos, da nossa Ordem.Lembramos ainda que a “natureza” talvez tenha sido o primeiro ato divino. Ohomem veio depois. Assim, acreditando que no que é divino não se toca (o que édivino é pessoal e intransferível), vamos começar pela natureza.
No princípio, o teatro talvez tenha chegado a nós, os artistas, cheios deinformações definitivas. Talvez tenhamos aprendido que ele, o espectador, deveassentar-se embaixo e no escuro e nós artistas em cima, iluminados. Que o atordeve encontrar de qualquer forma uma voz diferente ou um jeito de andar que nãoseja o seu no dia a dia concorrente da ficção. Talvez tenhamos aprendido que oque é épico é épico; o que é lírico é lírico; e o que é dramático é dramático. Não hámistura, só fronteiras. Que determinados estilos e conceitos são paradigmas claros,bases sólidas e intransponíveis para a criação.
No entanto, com o tempo, entendendo que a arte, assim como a vida, tem umaforma muito frágil e em constante mudança, somos, artista e público, convidadosa repensar o caminho. Se ela nos foi apresentada de determinadas formas, como tempo, somos convidados a repensar a forma como a apresentaremos para ooutro, o público. Repensar também em que capítulo desta antiga história estamos…Avançamos? Voltamos algumas páginas? Olha quanta fragilidade tem a nossa forma.
Com o ACTO1, queremos investigar como os grupos e os participantes têmfeito teatro, investigando as formas expressivas que são, por vezes, frutosde estratégias conscientes da criação e, por outras, resultados inconscientes:frutos inocentes da nossa inspiração, esse entusiasmo divinamente pessoal eintransferível. Se “querer é poder”, queremos também sinais de respostas dealgumas perguntas que nos perseguem para que possamos clarear os próximospassos e pisar ainda mais forte. Coincidentemente, os três coletivos participantesestão em fase de gestação dos próximos “frutos” ou preparando a terra.
Para isso, convidamos grupos que, nesses mais de dois anos em que existimos,nos identificamos com a substância de seus trabalhos. Ressaltamos que essaidentificação nasceu, sobretudo, por termos feito parte da experiência dosacontecimentos teatrais destes grupos: assistimos às peças do Grupo XIX de Teatroe da Companhia Brasileira de Teatro e percebemos que alguns pontos dos trabalhosfazem parte da matéria prima do teatro que gostamos.
Só para citar um dentre os diversos pontos, o tipo de relação travada com oespectador. Ele está conosco, presente, como nós. Ainda que comodamentesentado, sua respiração, emoções, sentimentos constroem o rito, juntos. Tambémgostamos de muitas outras coisas.
Gostamos quando, no início de “Suíte 1”, os atores permanecem um longotempo olhando para a platéia, como quem pergunta: “E então, quem começao espetáculo?”. Gostamos como as atrizes-autoras passeiam pelo textoem “Hysteria”, com uma dramaturgia aberta e, conseqüentemente, fresca,pulsante, além de outras coisas.
E, acreditamos que por trás desse gostar, existe um desejo em comum. Porisso, convidamos esses artistas para esse Encontro. Puro sentimento, afinidade,intuição… E técnica (por quê não?). Mesmo que estes grupos não sejamcaracterizados por uma técnica específica, elas podem ser vistas aqui e ali, comoresultado de uma estrada bem peculiar.
Assim, propomos uma forma de entender o que os moveu para chegar nas formasde seus espetáculos, inspirados no que disse de Pina Bausch: “…não interessatanto como as pessoas se movem e sim o que as move”.
Continuando a citar pessoas, Peter Brook disse uma coisa muito boa: “Na vida,nada existe sem forma, a todo instante somos forçados a procurar a forma”. Assimé também no teatro. Então, convidamos a todos para investigarem as formas denossos trabalhos, o que os levaram a serem assim, como nos movimentamos noteatro para que ele seja sempre o que é: uma arte provisória.
Bem vinda, Companhia Brasileira de Teatro!
Bem vindo, Grupo XIX de Teatro!
Bem vindo, Kil Abreu!
Bem vindo você, que veio compartilhar conosco!
O 2º ACTO! aconteceu em Belo Horizonte, entre 20 de outubro e 03 de novembro de 2010, reunindo mais uma vez Espanca!, Cia. Brasileira (PR) e Grupo XIX (SP). O ACTO2! foi feito em parceria com o FETO (Festival Estudantil de Teatro) e as atividades se deram no Teatro Espanca!, no Galpão Cine Horto, no Nelson Bordello e na Praça Duque de Caxias. Além de apresentarem trabalhos de seu repertório (Congresso Internacional do Medo, Vida, Descartes Com Lentes, Hygiene e Marcha Para Zenturo – fruto da parceria entre Espanca! e Grupo XIX), os coletivos ofereceram oficinas para artistas da cidade. A segunda edição, acompanhada pelo site Questão de Crítica, foi uma oportunidade para aprofundar as trocas artísticas entre os coletivos: além de mostrar a co-criação com o XIX, o Espanca! iniciou um projeto de intercâmbio com a Cia. Brasileira chamado “Troca de Pacotes”.
Cobertura do Questão de Crítica:
- ACTO2, UM FESTIVAL ÍNTIMO DO ESPANCA!, COMPANHIA BRASILEIRA E GRUPO XIX (publicado no Dossiê Espanca do site Horizonte da Cena)
- A LINGUAGEM DO OUTRO (sobre Congresso Internacional do Medo)
- UM OLHAR COM PENSAMENTO DE DENTRO (sobre Descartes com Lentes)
- MATERIALIDADE ARTESANAL (sobre Hygiene)
- UMA EXPERIÊNCIA DO TEMPO, DO ESPAÇO E DA VISÃO (sobre Marcha Para Zenturo)
De 20 a 30 de março de 2014 o Teatro Espanca!, o Galpão Cine Horto e o Esquyna receberam as atividades do ACTO3!. Desta vez, além do Grupo XIX (SP) e da Cia. Brasileira (PR), o projeto recebeu, pela primeira vez, o Grupo Magiluth (PE). A programação era composta pelos espetáculos “Isso te Interessa?”, “Viúva, Porém Honesta”, “Nada Aconteceu, Tudo Acontece, Tudo Está Acontecendo” e “Marcha Para Zenturo” (co-criação entre Espanca! e XIX), além de um Encontro Aberto mediado pela pesquisadora Eleonora Fabião. Foram 2 dias de demonstrações de procedimentos, aberturas de processos, leituras, discussões e intercâmbios envolvendo todos os integrantes dos grupos participantes e o público interessado. A 3ª edição firmou o ACTO! como um espaço potente de trocas entre companhias que, juntas, podem ser vistas como um livre panorama do teatro brasileiro contemporâneo.
A Companhia Brasileira de Teatro atua desde o ano 2000 em Curitiba, Paraná. Giovana Soar, Marcio Abreu, Nadja Naira e Cássia Damasceno tocam esse grupo que é conhecido pela criação, tradução e adaptação de dramaturgias singulares; pela inteligência perspicaz de suas encenações e também pela autenticidade das atuações. Assim como o Espanca!, o grupo possui uma extensa lista de artistas colaboradores, ótimos atores como o Rani, o Bonzão, o Ferrarini e até a Renata Sorrah! Você pode trombar com um “brasileiro” no Memorial da Cidade, no centro histórico de Curitiba, onde eles mantém sua sede (semelhanças com o nosso Viaduto não são mera coincidência). Conhecemos os piás num festival de teatro, quando assistimos o espetáculo Suíte1. Que beleza de espetáculo, que mais tarde esteve aqui no ACTO1!. Na mesma noite, encontramos “o povo da brasileira” num posto de gasolina e passamos a madrugada bebendo e conversando. Pouco tempo depois, reencontramos a Nadjinha no sul e promovemos um campeonato de sinuca (mineiros x paranaenses). Mais tarde, ela veio fazer a luz do Congresso e então era Espanca! e Brasileira criando juntos. E ao final do ACTO2!, começamos o Troca de Pacotes, um projeto de intercâmbio entre grupos tão amigos. Trocamos pacotes com textos, músicas, filmes, barracas de camping, nos visitamos, convivemos e criamos juntos um pequeno exercício cênico que misturava Leminski, Passô, Abreu e a melô do incentivo… Então a companhia trouxe Oxigênio para o Teatro Espanca! e o Viaduto ficou russo. Em 2013, era um momento delicado pra nós, nos encontramos no Festival de Cenas Curtas e nossas bocas festejaram: Taubira era uma cena linda, com atores fetiches que sempre nos beijaram. No ACTO3! eles ficaram todos nus e nós viramos uma mesma tribo. Que delícia a companhia desses brasileiros.
O Grupo XIX de Teatro trabalha desde 2001, em São Paulo-SP. A princípio, o grupo partiu de pesquisas históricas para criar espetáculos que buscavam afirmar identidades brasileiras. E desde o início, Janaina Leite, Juliana Sanches, Luiz Fernando Marques, Paulo Celestino, Rodolfo Amorim e Ronaldo Serruya desenvolvem uma bela pesquisa sobre a interação entre atores e espectadores no momento teatral. Conhecemos o pessoal do XIX um dia depois da estreia de Amores Surdos, num almoço no Passeio Público, em Curitiba (terra da Cia. Brasileira). Trocamos algumas palavras e fomos todos assistir ao Hygiene (segundo espetáculo do grupo, que mais tarde trouxemos pro ACTO2!). Depois eles vieram com o Hysteria pra BH e fizemos uma festinha pra eles na casa da Fê. Trocamos telefones e várias histórias. Um tempo depois, estávamos fazendo uma temporada em São Paulo e a festinha foi na casa da Sara. Levamos alguns vinhos e nessa noite, trocamos várias ideias. Constatamos que éramos grupos irmãos. Tempos depois do ACTO1!, fizemos o Barco de Gelo, um embrião do que seria uma peça criada pelos dois grupos. Então o Espanca! se mudou pra casa dos amigos, na Vila Maria Zélia, Zona Leste da cidade de São Paulo. A residência do Grupo XIX na Vila, que já dura 10 anos, é uma coisa linda de se viver. E foi lá, na primeira vila operária do Brasil, que Marcha Para Zenturo nasceu. O espetáculo é uma co-criação entre Espanca! e XIX, um trabalho que contém a força do convívio entre companhias que se conheceram intimamente. No ACTO3!, além de fazermos a Marcha juntos, o grupo mostrou que essa intimidade criativa é mesmo potente, mesmo quando é de mentira.
O Magiluth completou recentemente 10 anos de trabalho na cidade do Recife, em Pernambuco. O trabalho dos meninos é extremamente importante para a cena teatral nordestina e a força desses homens juntos em cena é impressionante. Erivaldo Oliveira, Giordano Castro, Lucas Torres, Mário Sergio Cabral, Pedro Wagner, Pedro Vilela e Thiago Liberdade são o carisma no palco e nos bares. Nós conhecemos o pessoal quando fomos mostrar o resultado do projeto Troca de Pacotes, que fizemos com a Cia. Brasileira. Eles apresentaram o Aquilo que Meu Olhar Guardou Para Você, um espetáculo porreta! Que cena e que grupo cativantes. A peça foi dirigida pelo Lubi, do Grupo XIX (que também nos dirigiu em Marcha Para Zenturo) e pouco tempo depois veio para o Teatro Espanca! junto com Um Torto. Nada mais prazeroso do que receber os amigos no nosso próprio Viaduto. Depois disso, assistimos juntos ao show da Karina Bhur, tomando cachaça de jambu numa praça deliciosa do interior de Pernambuco. E em 2013, voltamos ao Recife no TREMA! – Festival de Teatro de Grupo realizado pelos meninos na raça, na tora e com amor. E o TREMA é uma delícia. E o Recife é uma beleza. O ACTO3! foi a primeira vez do Magiluth no nosso Encontro que, como o teatro, é um ato de fé.