Por Elise
trilha sonora:: texto e direção de Grace Passô
:: com Grace Passô, Gustavo Bones, Marcelo Castro, Renata Cabral e Sérgio Penna
Uma Dona de Casa que narra histórias de seus vizinhos; um Cão que late palavras; um Lixeiro em busca de seu pai que há anos não vê; uma Mulher perdida; um Funcionário que trabalha como recolhedor de cães doentes, protegido em um uniforme que faz com que ele não sinta nem quando o espancam, nem quando o amam. Por Elise é a primeira criação do Espanca! e deu base para a origem do grupo. Possui a simplicidade do espaço vazio e a potência da semente de uma árvore frutífera. É composta por situações que primam pela teatralidade nas revelações constantes das relações humanas, pois é no encontro entre esses personagens que se revela o universo humano de cada um. Como uma fábula sobre o comportamento do homem contemporâneo: as contradições dos sentimentos, as formas como vive medindo o quanto se envolve com as coisas, o quanto se protege delas. E nessa busca, o amor espanca os homens, docemente.
Por Elise estreou dia 22 de março de 2005 no teatro José Maria Santos, em Curitiba, Paraná. O espetáculo já foi visto por aproximadamente 35.000 pessoas em 186 sessões realizadas em 50 cidades de todas as regiões do país. Além de apresentações em Berlim, na Alemanha, compôs a programação de 27 festivais nacionais e internacionais do Brasil. Fez temporadas em Belo Horizonte, São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba. Venceu os Prêmios APCA e Shell-SP de melhor dramaturgia. O Espanca! ainda foi indicado na categoria especial do Shell, pela criação e concepção do espetáculo. A peça recebeu também o prêmio SESC-SATED/MG de melhor espetáculo e texto.
Grace Passô
Gustavo Bones
Marcelo Castro
Paulo Azevedo
Renata Cabral
Samira Ávila
Grace Passô:
Comecei a pensar Por Elise há muito tempo, quando escrevi algumas situações que considerava teatrais, situações que, no meu ponto de vista, tocavam na natureza do teatro. A primeira situação escrita nessa peça, há muito, foi a de um lixeiro que encontrava seu pai que não via há anos, na rua, enquanto corria trabalhando. Olha um pedaço dos primeiros rascunhos:
Lixeiro: Pai?
Pai: Bom dia.
L: …
P: Sou eu mesmo.
L: …
P: Quanta saudade. (tenta se aproximar)
L: Não vem. (ouve-se GRITOS de outros lixeiros, apressando-o) Eu tenho que ir.
P: Espera.
L: O que o senhor quer? Eu tenho que ir, não está vendo?
P:. Você está crescido, é um homem.
L: É? (medo, desconfiança)
P: …
L: …
P: É, está. Porque não olha pra mim?
GRITOS DOS LIXEIROS
L: Eu tenho que ir.
P: E seus irmãos?
L: Estão bem. Está tudo bem.
P: E sua mãe? Eu tenho saudades dela também.
L: …
P: Porque não olha pra mim?
L: (olha em seus olhos) Porque o senhor sumiu? Porque não te vejo há tanto tempo? Porque está aqui, me atrapalhando?
P: …
L: …
P: … Você… recebe o dinheiro que te mando para as aulas de inglês?
L: …
P: Eu sempre quis falar inglês
L: …
P: Tudo bem, eu te entendo. Eu não vou me justificar, o que você sente está no seu lado de dentro, muito do lado de dentro… E eu não posso te virar aos avessos. De qualquer forma eu queria muito encontrar com você nem se fosse pra ficar assim, em silêncio. Eu já estou bem feliz de te ver assim… forte, um homem forte..
L: Eu tenho que ir…
P: Espera. Eu sei que tem que ir. Aceita um cigarro?
L: Eu não fumo.
P: Graças a Deus.
L: Esse cigarro é o mesmo que o senhor saiu para comprar, anos atrás, e não voltou mais?
P: Não fala assim.
… E assim se seguia a cena. Achei tão intenso isso de um lixeiro, enquanto trabalha, encontrar seu pai perdido em sua história… e intuí que havia aí uma lógica poética. Depois comecei a escrever um discurso de uma Dona de Casa, que, assim como minha mãe, dizia coisas muito sábias de forma simples; uma senhora em que a sabedoria havia nascido em si pela experiência e pelo tempo. Intuindo que essa personagem seria uma espécie de narradora do que viria a ser uma peça, ela teria essa função de ter certo domínio da história, assim como têm os narradores. E também assim iam nascendo alguns outros personagens.
Tempos depois, desejei dirigir um espetáculo pela primeira vez e então esses escritos precisariam ser terminados. Quando nos reunimos apresentei o texto aos componentes do que viria no futuro a ser o que somos hoje: o grupo Espanca! No processo de construção do espetáculo muitas coisas foram mudadas no sentido de introduzir dramaturgicamente o texto na cena. Nesse processo várias modificações foram feitas para que o objetivo primário, que é o “espetáculo”, significasse uma única linguagem e obra artística.
Já no processo de construção da peça, o grupo se revelou não só como um grupo de atores mas também de criadores: a cada ensaio a concepção geral do espetáculo foi discutida e proposta conjuntamente, várias modificações foram propostas por todos, acrescentando a essa obra o fato que fazer uma peça de teatro é uma questão coletiva. E assim, em conjunto, demos origem ao espetáculo Por Elise.
Como diretora, acredito ter buscado uma encenação que surpreendesse a forma, sem perder de vista seu significado no discurso da peça. Buscado o “estranhamento” da forma sem vangloriar-se dele. Acredito também que foi um processo generoso, em que os cinco criadores se engajaram na construção de forma bonita.
E ainda, por minha vez, intuo que essa obra tenha uma qualidade muito especial: a inocência. A inocência da primeira direção, do primeiro texto encenado, a inocência da primeira obra de um grupo, o primeiro sopro em conjunto. Ai, que fresca é a primeira brisa da manhã.
Gustavo Bones:
O QUE ME MOVE É A INTENSIDADE DA FÉ.
Quando começamos a ensaiar o espetáculo, Grace me pediu que fizesse um para-casa e, como ponto de partida, recebi um recadinho da senhora Elise: “Eu estava pensando e acho que o lixeiro pode ser um homem de fé. E gostaria que você fizesse uma cena com o título ‘O que me move é a intensidade da fé’”. Naquela época, inocente que era, eu não acreditava em Deus. Subestimava, prepotente que sou, a gigantesca força contida no menor ato de fé. Porém, ótima como de costume, D. Elise me preveniu: “Ter fé não é fácil como se pensa de maneira desavisada”.
E então comecei a correr… Corri porque havia uma ordem. Correr. Corri porque gritavam a todo instante pra eu não parar. Correr. Corri porque não havia outra coisa a fazer. Correr. Corri porque não sabia fazer de outro jeito. Correr. Corri porque D. Elise disse: corra! Corra! Corra! Correr. Corri porque precisava encontrar meu pai, onde estará meu Pai? Correr. Corri pra me esquecer do meu pai. Correr. Corri procurando um sentido em mim que basta. Correr. E esse sentido não chega! Correr. Correr procurando entender o porquê de tudo isso. Correr…
E corri tanto! Mas como corri… Até que um dia cansei. Cansei. Parei. Perguntei: correr pra quê? Correr pra onde? E aconteceu um instante. Um instante minúsculo. Um desejo inquestionável que não me deixou desistir. E recomecei a correr…
Dizem que momentos como este, tão infinitamente pequenos, estes instantes tão cansados da vida, esses átimos sem esperança, chamam-se Deus. Nesses mini-segundos, Ele nos dá uma pista, nos consola com a possibilidade de Sua existência. E a gente, carente que somos, larga tudo e volta a correr. Corre pra ver se era Ele mesmo. Dizem…
Foi “Por Elise” que me ensinou o nome desse desejo. Desse desejo de vida. Foi “Por Elise” que me ensinou, também, que o mais legal era procurar por Deus – e não encontrá-lo. Que encontrá-lo é só um pretexto pra recomeçar a correr. Deus é recomeço. Corremos na esperança de um dia revê-lo. Fé é esperança. Sou um homem de fé. E agora não quero mais saber se Deus existe. Quero saber é quem respira por Ele! Quem? Quem? Quem? Quem? Quem?
Marcelo Castro:
CÃO É COISA QUE NÃO SE REPRESENTA.
Aprendi com Por Elise que o Teatro não precisava descrever o mundo ou imitá-lo. Estava declarada uma guerra no campo da Linguagem, uma guerra contra o que está posto à nossa volta. O que é realmente um cão?
Um dia caminhando pela Avenida do Contorno Grace me incitou a pensar em um “organismo vivo”; e esta palavra, “organismo”, me guiou durante um bom tempo. Mais tarde me dei conta que às vezes, era necessário desapresentar o personagem, escondê-lo do público, para mostrá-lo na hora precisa. E é bonito quando já no meio do espetáculo escuto alguém na platéia cochichando: “olha! olha! ele é o cachorro!”
Paulo Azevedo:
COMO CABER EM UMA ROUPA
Agora vamos conversar. Daquelas conversas atrasadas que podem durar pouco mais que minutos. Já começou.
A família vai bem. Os cachorros continuam latindo palavras bonitas vizinhança afora. A passagem pro Japão continua cara: um sonho de consumo. As ruas continuam limpas. Moças bonitas passam correndo na traseira de ônibus, estampando prédios, caindo em queda livre. Os abacates estão em falta. A vitamina virou um sucesso no meio cult. É servida com gelo seco e Dry Martini nos principais cafés da cidade. Eu? Não tomei ainda não. Pra não engordar.
Imagine que comecei poucos anos atrás a usar um uniforme meio estranho. Os estilistas diziam ser uma mistura de frentista de posto BR (bem verde bandeira, com boné e tudo!) com colete no tronco e um protetor no braço direito feitos de espuma crua. Foi o primeiro passo. Caí no mar e quando se está lá no meio, bem no meio mesmo, a gente não consegue parar para pensar e dizer: “Olha, isso seria melhor se fosse feito assim, se eu andasse assim, se falasse assim…”. Não teve jeito. Fui no impulso ingênuo, despretensioso, de algo urgente, pra ser feito naquela hora. Foi um susto, um momento de suspensão, de sentimentos sem nome, o nascimento. Com essa roupa, segui grandes marcas no chão, duro, pouco à vontade ainda. Precisa experimentar outro corpo, com outra roupa.
Na ressaca do parto, um pouco de racionalidade é sempre bem vinda: com esta roupa não dá. Aumenta aqui, troca ali, costura aqui. E eu lá dentro na busca de um espelho que me desse a possibilidade de ver de fora, entender de fora, sentir de fora. Bora outra vez. Agora como diriam novamente os profissionais da área fashion: “Tá claro que a calça e a camisa são bem melhores que o macacão, mas este colete… este colete pode até proteger, mas ainda não é”. Não precisa ser especialista pra perceber isso. E eu lá dentro. Os pés firmes, desde o início. O chão era fértil, um bom lugar para plantar, criar, colher. Um chão que aos poucos virou território e hoje tem nome: Grupo Espanca!. Interessante este nome. Sabe, me disseram pra não sentir, não me abrir, ser indiferente. Mas será que tem gente que é assim? Isso é gente? Por isso, segurei tudo e veio uma batida forte do coração literalmente na cadência do samba. O coração é uma escola! Vi o sol. Cai. Levantei. Cai de novo e esbravejei em japonês. Outro dia revi esta imagem e confesso que fiquei até um pouco comovido. Forte.
Novos passos. “Vamos embalar tudo, não pra ele não correr o risco de se machucar, de sentir nada!”. Terceira tentativa. Tira o boné e muda o abacate (afinal, pra quê abacate tem caroço?). Soa bem definitiva, soa como a última vez. Coube! E eu pensando: Mas como é que entra nisso? Como é que anda nisso? Como é que cai? Dá pra ir ao banheiro rapidinho antes de entrar? Não. De cara nota-se. Até aí foram meses. Cresci. Engordei. Emagreci. Experimentei o drink de abacate (uma vezinha só). Veio a crise: ainda não é isso. Tentei ser alemão, ser durão, ser outra coisa que não me fez dançar com esta roupa. Sentir a pele solta lá no oco, mesmo protegida.
Pele. A pele solta água, né? Interessante isso. Porque a roupa foi aos poucos sendo absorvida de mim. A espuma encharcou até que ela e eu achamos um lugar comum: o corpo. Com ele veio a intenção mais clara, a fala mais humana, a compreensão do caminho. Gente é uma represa d’água, grande, segura, estável, até que um vazamento aqui, um poro aberto ali, uma fissurinha, um rasgo e… Rompe-se uma torrente de sentimentos estancados, fazendo o coração sair correndo em direção ao mar! Ai, ai… A roupa está do meu tamanho, e eu do dela. Estamos juntos. À base de muito estica e puxa, de apertos, cortes, de caminhadas, corridas, vôos, e muitas, muitas palmas. Cerimônia que ela, a “roupa protetora” (deixa “ela” continuar acreditando que me protege, deixa…) e eu, vimos muitas noites e celebramos este encontro que me faz acreditar ser o primeiro de muitos. Isso, a Senhora certamente não imaginava. A vida é assim, imprevisível.
______________________
Funcionário.
BH, verão de 2007.
P.S: Dona Elise, quando passar pelo seu quintal antes de dormir, lembra de dar “Boa Noite” com carinho a cada galinha e apague as luzes para que elas tenham um sono feliz.
Renata Cabral:
AOS SENHORES E SENHORA ESPANCA!
“Que gentileza bruta!” E foi com a sutileza dessas palavras doces e fortes que me encontraram nessa história. Foi com o tempo correndo, correndo, correndo… A “bruteza” foi o susto e a gentileza foi de não me negarem o profundo nessa velocidade. Essa era mais de todo mundo do que minha.
Me lembro dos primeiros ensaios, das caras, dos corpos, do tempo de cada um que não me pertencia, ou não me conhecia… É diferente o contato da cerveja e o contato do olho e do corpo, né? O corpo procurava encaixe naquelas palavras, nos outros corpos, nos acertos do tempo, na corrida, mais do que no espaço, por um espaço. O espaço foi construído devagar, com a paciência daquele que me pedia para ficar um pouco mais. E a gente corria, corria, corria. Em direção a nós mesmos. Falamos de respiração, de emoção, de languidez, daquilo que vamos entender só lá na frente, do que se toca… Mas até onde podíamos nos tocar? Ninguém sabe, acho que até hoje não sabemos. O ser humano é uma coisa delicada, né?
A gente se procurava. Que coisa importante! Não sei. Sinto que nos procuramos até hoje… Um dia tivemos que latir. E como é difícil a bruteza exposta, a bruteza de mim, sabe? Latir naquele lugar foi isso, ter que sentir raiva para não esconder. Eu não podia esconder. Com tempo fui entendendo que latir é mais. É o essencial da vida. O primeiro sopro ou a primeira explosão. É aquilo que precisa ser colocado pra fora pra que as coisas mudem, pra que a vida mude, pra que se caia, mas levante ali na frente.
E pode ser no mar…
Acredito que eu tenha sido um latido em vocês, mesmo rouco. Vocês foram um latido em mim e que veio de mim. Como deve ter sido difícil essa pessoa estranha, espanca! E como eu não senti isso.
Ai, agora eu já não sei de mais nada!
Obrigada!
Mulher.
Samira Ávila:
DO DIA EM QUE VIREI UM BICHO
Lembro do ensaio em que a Grace me deu quatro páginas de xerox do capítulo “A viagem” do livro “Perto de um coração selvagem”, da Clarice. Minha Mulher já sabia cair, mas tinha que aprender a se levantar. Eu tinha dificuldades de encontrar forças pra ela. Achava que ela não tinha mais motivos para seguir em frente, para repetir tudo. Aí eu li o texto da Clarice. Fiquei perturbada com a mulher do coração selvagem. Sempre gostei de cavalos. Queria que o grupo se chamasse “Grupo de Cavalos” e já havia decidido há muito tempo que quando eu tiver um cachorro ele vai se chamar “cavalo”. Já tive um cavalo também quando era pequena, mas acho que era mentira do meu pai. E, sim, Clarice: eu iria me arranjar sendo um bicho. Reli o texto.
“(…)eu serei forte como a alma de um animal e quando eu falar serão palavras não pensadas e lentas, não levemente sentidas, não cheia de vontades de humanidade, não o passado correndo o futuro! O que eu disser soará fatal e inteiro! Não haverá nenhum espaço dentro de mim para eu saber que existe o tempo, os homens, as dimensões, não haverá nenhum espaço dentro de mim para notar sequer que estarei criando instante por instante, não instante por instante: sempre fundido, porque então viverei, só então viverei, só então viverei maior que na infância, serei brutal e mal feita como uma pedra, serei leve e vaga como o que se sente e não se entende, me ultrapassarei em ondas, ah, Deus, e que tudo venha e caia sobre mim, até a incompreensão de mim mesma em certos momentos brancos porque basta me cumprir e então nada impedirá meu caminho até a morte-sem-medo, de qualquer luta ou descanso me levantarei forte e bela como um cavalo novo”.
Escrevi muito urgentemente alguma coisa atrás de uma das folhas do xerox e fizemos uma improvisação da Cerimônia das Palmas. Era aquilo. A Mulher nunca ficou tão fraca, era extremamente cansativo tentar se salvar. E se levantar não significava ser forte.
“O que nela se elevava não era a coragem, ela era substância apenas, menos do que humana, como poderia ser herói e desejar vencer as coisas? Não era mulher, ela existia e o que havia dentro dela eram movimentos erguendo-a sempre em transição”.
Quintal da existência, de Eduardo de Jesus
Grupo mineiro traz lições de delicadeza na bagagem, de Kill Abreu
Crônicas delicadas, de Paulo Sérgio Scarpa
Delicada e sincera, “Por Elise” parece feita para cada espectador, de Sérgio Sálvia Coelho
Por Elise e Amores Surdos: poéticas textuais, de Marcos Antônio Alexandre
Eduardo de Jesus:
QUINTAL DA EXISTÊNCIA
“Por Elise” parte da estrutura extremamente fragmentada do texto de Grace Passô, desenvolvido em conjunto com os integrantes do grupo Espanca!, o que acentua a força da memória no espetáculo
publicado no Estado de Minas do dia 04 de fevereiro de 2006.
Algumas vezes são situações mais ordinárias da vida cotidiana que fazem brotar uma imagem poética. Lembranças esparsas embaladas pela ausência de recordações mais palpáveis acabam celebrando o fragmento e o mínimo movimento da memória cheia de uma espécie de poesia do cotidiano. Podemos lembrar de Proust, seja nas madeleines ou nas figuras em que “a lanterna mágica fazia passear pelas cortinas do meu quarto ou subir ao teto – enfim, sempre envolvidos no mistério dos tempos merovíngios e banhados, como em um poente, na luz alaranjada que emana desta sílaba: antes”.
São múltiplas tramas dessas situações mínimas – com imagens que surgem e logo se apagam – que se constrói o espetáculo Por Elise, do grupo mineiro Espanca!. Primeira produção do grupo, a peça alcançou imediato reconhecimento de público e crítica nas diversas apresentações, ao longo de 2005 e início de 2006.
A estrutura extremamente fragmentada do texto de Grace Passô, desenvolvido juntamente com os outros integrantes do grupo, acentua esse caráter de memória no espetáculo. Tudo parece como se fosse uma imagem exibida por pouco tempo, deixando apenas uma marca suave, um registro tênue. É justo nessa superfície de uma memória aberta e coletiva que essas imagens sejam geradas e sutilmente inscritas, como no bloco mágico de Freud. Mas em Por Elise a intensidade na mistura das imagens cria uma topologia dinâmica da acumulação dos fragmentos, sejam vidas, sentimentos ou memórias.
O que mais chama a atenção é esse modo de construir a narrativa. São pequenos fragmentos lançados ao público que os vai juntando daqui e dali, em busca de sentido. É como se estivéssemos mesmo naquele quintal, com aquele enorme (?) abacateiro, fugindo para os abacates não nos atingirem e ao mesmo tempo tentando proteger os personagens dessa intempestiva situação limítrofe entre viver e arriscar-se a viver. Assim podemos ver em Por Elise uma tensão entre as possibilidades do risco e do envolvimento. Como envolver-se e viver? Como arriscar-se e viver? Como viver sem envolvimento?
Logo no começo do espetáculo a dona de casa (Grace Passô) nos chama a atenção: “Não se envolva!”. Frase estranha quando pensamos que, de alguma forma, hoje em dia isso já é uma ordem. Essa vida de sentimentos anestesiados, de contenção e de nenhum envolvimento com qualquer coisa que seja. No atual universo big brother de intimidades vigiadas a distância e de contatos assépticos mediados pela televisão, a frase parece mais um grito de resistência, uma advertência de quem vive entre o risco da morte e a vida. A primeira resposta possível à advertência da dona de casa é: “Ora, nós não nos envolvemos mesmo!”.
No entanto, com o desenvolvimento da peça, algumas vezes somos o cachorro (Marcelo Castro) “latindo” palavras ou a mulher (Samira Ávila) impossibilitada de se manter erguida. Os lampejos da narrativa exigem, pela fragmentação, envolvimento com a peça. Assim, sutilmente, em busca de sentido para os fragmentos da história, somos envolvidos por essas vidas destroçadas pela urgência do cotidiano e pela ausência de sonho. Ao longo do espetáculo vamos, pouco a pouco, com esses personagens lampejantes, buscar sentido para suas vidas que, como as nossas, algumas vezes deslizam em uma total falta de razão. O movimento de envolver-se com a narrativa, com os personagens e com nossas próprias vidas parece ser o ponto central da peça e isso reflete no modo como o texto é articulado e encenado pelo grupo. A montagem parece ressaltar essa idéia de uma imagem fugaz, quase sem registro, seja pela rapidez de sua aparição ou pela sutileza com que a luz mais esconde do que revela, desenhando assim uma aproximação com a memória, com a lembrança que se acende e apaga ao ser sensibilizada por algum estímulo.
Em todo esse movimento, quando vemos, já estamos envolvidos. Passamos a nos ocupar com aquelas situações. Estilhaços nos chegam e parecem revigorar a memória de uma certa casa com um abacateiro, de uma pessoa com medo da solidão, de alguém farto do imediatismo buscando no distante, no estrangeiro e no desconhecido, a razão de ser dos seus sonhos e de sua própria vida. Todas essas imagens são de uma memória, parecida com as tramas de Penélope, feita e desfeita, nesse caso pelo incontrolável ritmo da vida. Não essa vida freqüentemente exibida pelos meios de comunicação (entre as informações e o entretenimento), sem mostrar qualquer coisa que fuja ao controle. Tudo bem organizado e adequado. As vidas de Por Elise são o oposto disso. Não há certeza, não há lugar definido. O que existe é uma urgência, uma aflição, uma vida que brota estranhamente, ao se destroçar o cotidiano.
Mas memória de quê? Talvez esse aspecto da memória tenha me chamado a atenção no espetáculo, por acreditar que nas situações não controladas e imprevisíveis da vida cotidiana seja possível, pelo menos pra mim, encontrar um termo perdido e fabulador, mistura de lembranças vividas ou não. Na verdade, se há o registro delas, como no bloco mágico, foi tão tênue que não deixa a certeza de sua inscrição.
Mas que lembrança essa memória nos oferece? Talvez a memória de uma vida pequena, impossível de chamar a atenção, exceto quando, por um movimento qualquer se envolve. A vida parece ganhar um viço, uma possibilidade de proteção e segurança. Afinal, quem poderia segurar a mulher (distinta e desesperadamente vestida de vermelho)? Quem poderia ajudá-la a manter-se de pé senão o lixeiro, que em suas afobadas idas e vindas acaba se envolvendo. Um lampejo que agora se faz vida e nos contamina.
Ao terminar o espetáculo, estamos todos com os fragmentos reunidos e completamente envolvidos pela delicadeza dos personagens e da história. Agora, na tentativa de ver como esses fragmentos recolhidos do universo de Elise podem servir para nos envolver com o que está à nossa volta. Assim, mais uma vez, estaremos vivos e abertos ao imprevisível da própria vida que, como o abacateiro, dá frutos. Às vezes não conseguimos nem pegar e nem fugir deles, mas somos, na verdade, atingidos distraidamente por eles.
Kill Abreu:
“POR ELISE”: GRUPO MINEIRO TRAZ LIÇÕES DE DELICADEZA NA BAGAGEM
publicado no Diário do Fringe de 24 de março de 2005.
“Pour Elise”, a composição de Bethoven, traz uma freqüência que segundo os músicos reverbera sem machucar. Em “Por Elise”, o espetáculo, há algo que, como se diz na peça, “espanca doce”.
A música, vulgarizada nas visitas dos caminhões do gás, é o tema perfeito para a inspiração da dramaturga, atriz e diretora, Grace Passô. A imaginação lírica que o espetáculo faz revelar contorna a ambição dos grandes temas e nos leva às portas de estórias tão ordinárias quanto as de qualquer homem comum. No entanto, pelas mãos da autora elas são abertas com a chave de uma síntese poética extra-ordinária, que nos faz viver, no decorrer da encenação, breves sustos e pequenas epifanias.
O que primeiro chama a atenção é a disciplina rara para fazer equilibrar o lirismo da linguagem e a objetividade da narrativa. A poesia das falas dispensa malabarismos verbais e tem a medida certa para provocar o andamento da fábula. Nessa dinâmica o texto anuncia imagens que na cena ganham traduções surpreendentemente simples e potentes. Algo como um lixeiro que durante o trabalho fantasia estar correndo a caminho do mar.
São quadros que desenham a felicidade pouca e fugaz no encontro entre personagens protegidos por alarmes, cercas, preces e falsos – mas eficazes – amuletos. Em uma inversão radical e recorrente no teatro contemporâneo, trata-se de uma espécie de narrativa épica às avessas: um épico íntimo, em que a tarefa parece se traçar, através do relato em tom confessional, as coordenadas da subjetividade no ambiente das relações cotidianas.
Jovem que seja, o Espanca! resolve com serenidade seu projeto artístico. A montagem, até aqui certamente uma das mais bem sucedidas do Festival, revela excelente desempenho de Grace Passô em todas as funções criativas a que se propõe, da fina fatura dramatúrgica ao envolvente resultado cênico. Traz também um elenco talentoso e valente, que mostra compromisso pleno com o representado.
Ressalva feita a uma ou outra passagem em que a cena ainda não encontrou a medida correta de exposição, “Por Elise” dispensa a expectativa do grande espetáculo. Deve ser visto da forma como se lê um breve poema e delicado poema. Para ficar entre os mineiros, é como diria Adélia Prado: a vida é uma complexa engrenagem… mas basta um toque e…
Paulo Sérgio Scarpa:
CRÔNICAS DELICADAS
publicado no Jornal do Comércio de Recife, no dia 20 de novembro de 2005.
Os mineiros do grupo Espanca! mostram que gostam de contar histórias, assim como seus mais ilustres cronistas da vida cotidiana. Simples crônicas diárias que povoam a imaginação de moradores de um bairro fazem da peça Por Elise, criação coletiva arrematada pela atriz e diretora Grace Passô, uma série de encontros e desencontros de gente comum, que não sofre de complexos problemas existenciais, mas que enfrenta a solidão, a falta de comunicação e a dificuldade de dizer direitinho o que se quer e precisa ser compartilhado.
É a primeira peça do Espanca! que foi mostrada este ano no Festival de Teatro de Curitiba, onde teve excelente recepção, e foi assim por onde passou até agora. Nada mais natural para um grupo de jovens dispostos a atuar e mostrar que gostam do que fazem. Para isso, não precisam nem de cenários – os figurinos são simples, eficientes e adequados, e a iluminação cumpre o papel de comentar e acentuar situações dramáticas. E desmistifica a falsa pretensão de que um grupo deve encenar o texto mais difícil para provar que é bom ou cobrir de luxo uma montagem.
O grupo Espanca! nos lembra o que diz a crítica teatral Bárbara Heliodora sobre a pretensão de grupos teatrais iniciarem seu caminho encenando clássicos gregos ou obras-primas da dramaturgia mundial que exigem, antes de qualquer coisa, muita compreensão por parte do encenador e dos atores. Nada pior que uma encenação que peca pela falta de humildade ao optar pela arrogância para provar que é boa e o grupo chegou para ficar.
Por Elise é uma pequena, imaginativa e bem-sucedida fábula contemporânea sobre pessoas que poderiam até ser qualificadas como ordinárias, no sentido menos pejorativo do termo. Homens e mulheres cercados de situações bem-humoradas, algumas irônicas e outras de extrema emoção, sem cair nunca no sentimentalismo barato, como aquela em que a mulher se despede de seu cachorro que será imolado. A cena é muda, apenas olhares, gestos inacabados, iniciativas interrompidas ao se tentar dizer adeus. Para que falar quando olhos, bocas e corpos conseguem dizer mais que as palavras?
A montagem privilegia as atuações. Os atores se mostram soltos ao revelar as contradições dos sentimentos humanos. São frases que podem parecer até banais, colocações divertidas e inesperadas, como a história de uma mulher que leva sucessivos sustos com a queda de abacates maduros, por sinal os únicos adereços num palco completamente vazio. Ou como uma mulher solitária se deixa envolver por um lixeiro enquanto faz de tudo para evitar que seu cachorro seja levado pela carrocinha. Um cachorro, por sinal, que fala ao latir.
A peça inicia com a expectativa de que muitas histórias sejam contadas, como a da mulher que viu nascer uma alface no peito e se abriu para a vida; ou a daquele homem que, enquanto sofria um enfarto, ria da vida.
Delicadezas e maturidade que deixam a platéia a princípio sem saber o que fazer e como reagir, mas que, após entrar no jogo teatral, se deixa seduzir por olhares, frases inacabadas, gestos parados no ar. E os atores não se intimidam diante de situações cômicas, nem se deixam cair na tentação do dramalhão diante de fragilidades que poderiam se tornar até ridículas. Não imaginem que o grupo se comporte como amador apenas por ser a primeira peça montada.
Por Elise fala de quintais, de caminhões de gás que cantam nas ruas o Pour Elise, de Ludwig van Beethoven, e de cachorros. O grupo nos força a ver um dia-a-dia que a pressa, o corre-corre do trabalho e a solidão não nos deixa perceber, assim como os movimentos suaves de um tai-chi-chuan executado com o mesmo refinamento e graça dos gestos orientais.
O olhar desses jovens mineiros sobre o ser humano é sempre delicado e generoso, sem deixar de ser agudo e crítico. E a peça é um elogio à palavra. Até quando, no final, o grupo revela que o maior pecado de todo mineiro é querer fugir para o mar.
Sérgio Sálvia Coelho:
DELICADA E SINCERA, “POR ELISE” PARECE FEITA PARA CADA ESPECTADOR
Publicado na Folha de São Paulo do dia 09 de outubro de 2005.
Grace Passô tem abacateiros em seu quintal. Vive com medo de um deles cair na sua cabeça. “Cuidado com que você planta”, avisa ela logo no começo do espetáculo “Por Elise”, como quem segura o riso (ou o choro).
O conselho, pleno de ingenuidade e sabedoria na melhor tradição popular, parece derivar do “cuidado com o que você deseja, porque pode dar certo”: ao mesmo tempo, encoraja ao desejo e adverte sobre suas possíveis conseqüências.
Como uma fábula de formação, seguindo o caminho do haicai em seus saltos narrativos e seus silêncios profundos, “Por Elise” tira poesia até mesmo da música dos caminhões de gás (sim, é a ela que o texto alude).
Frases banais vão ganhando profundidade a cada repetição, e o público descobre, encantado, que está recebendo profundas lições de vida de um elenco tão jovem. Cada metáfora, contundente e inesperada, cai com precisão, enchendo ouvinte de dor e doçura: “Espanca doce”, como a queda do abacate, dando nome ao grupo que saiu de Belo Horizonte com seu primeiro trabalho e vem se consagrando pelo Brasil todo.
Personagem de si mesma, Grace mostra em seu texto encontros entre personagens implausíveis, como a gente encontra na vida cotidiana. Uma moça, desorientada por ter que sacrificar seu cachorro (Samira Ávila, delicada e intensa), se apaixona pelo lixeiro, que parece saber onde vai (Gustavo Bones, de uma simpatia irresistível). O moço que vem para sacrificar o animal se mostra mais profundo que sua profissão deixaria pensar: sonha em ir para o Japão (Paulo Azevedo nunca cai no caricatural com um personagem tão difícil) e acaba deixando se contagiar pela fragilidade do mundo. Marcelo Castro, que faz um personagem que se revela aos poucos, está inesquecível.
A múltipla Passô, na direção sabe coordenar e compartilhar a criação do espetáculo: refere-se aos atores como “intérpretes criadores”, faz o tai-chi da direção de movimentos reverberar tanto na trilha de Daniel Diazepam quanto no preparo vocal de Le Thi Bich Huong, enquanto o figurino de Marco Paulo Rolla revela com poucos recursos o essencial de cada personagem. Com essa dinâmica, o grupo Espanca! remete à Cia. Livre de Cibele Forjaz.
Encerrando temporada hoje, “Por Elise”, com sua delicadeza e maturidade, é um desses espetáculos que parece ter sido feito especialmente para cada platéia. Deixa saudades, como uma conversa sincera entre amigos. Voltem sempre.
POR ELISE E AMORES SURDOS: POÉTICAS TEXTUAIS, de Marcos Antônio Alexandre
publicado no Dossiê Espanca do site Horizonte da Cena em setembro de 2015
Dona de Casa: Historinha eu tenho mil. Poderia contar várias aqui para vocês. Tem a da senhora que brotou uma alface no meio do corpo dela. E ela se abriu para a vida. Essa é ótima. Uma das melhores que já ouvi por aqui. Tem a daquela mulher que estava triste andando na rua e caiu no bueiro: só que lá dentro encontrou um homem na mesma situação. E então eles ficaram alegres. Olha que loucura. […] E há outras histórias sobre moradores daqui… como dizia o Valico: “histórias vitalícias” Oh! Valico.
Ela se lembra do Valico.
Dona de Casa: Ele teve um enfarte no coração e durante o enfarte começou a dizer, me dizer uma porção de palavras bonitas e espontâneas. A vida dele se enfartou e ele teve um ataque de lirismo. Eu juro. Muitas das coisas que eu falo aqui são dele, que gravei daquele momento.
[…]
Cai, vindo do alto, um abacate próximo a Dona de Casa. Ela sente medo.
Eu sou aquela que há alguns anos plantou um simples pé de abacate no quintal de sua casa. Ele cresceu. E então eu vivo assim. Assim! (ela sente medo) Cuidado com o que planta no mundo! Mas por aqui, como eu, existem outros moradores desprotegidos, mesmo com cães dentro de casa. Companheiros de muros: muros de tijolos, muros de pele. Sabe “proteção” é mesmo bem importante. Eu, por exemplo, sempre quis colocar colchões largos em volta do pé de abacate de minha casa. […] (PASSÔ, Por Elise, 2012, p. 14-15)
Joaquim: Boa noite. Obrigado por terem vindo. Desculpem começar assim, cortando o sonho de vocês, mas para que tanto suspense? Todas as histórias do mundo já foram contadas. Essa é só mais uma história de uma família comum, que toma café, em que um briga com o outro, em que um adoece, enfim: com nossos problemas cotidianos. No começo, este telefone vai tocar, porque meu irmão, que mora longe, está com muitas saudades de nós. Depois nós vamos ficar aqui, convivendo com nossos hábitos particulares; até que no final o telefone vai tocar novamente, nós vamos atender e receber a notícia de que meu irmão se suicidou. A nossa história é essa.
Vocês são grandes, eu sou grande, ninguém aqui é Pequeno… todo mundo aqui sabe onde está. Todos sabem que amanhã eu vou repetir as mesmas coisas que eu estou falando agora. Todos sabem que amanhã eu vou entrar nesse lugar e dizer:
Boa noite. Obrigado por terem vindo, mas todas as histórias já foram contadas… […]
É isso: todas as histórias do mundo já foram contadas… Vocês sabem: em alguma hora, um celular vai tocar aí (apontando o espaço da plateia), algumas pessoas vão pensar: “Nossa, que falta de educação deixar o telefone ligado aqui!” Aí o dono ou vai desligar seu telefone para ser fiel à educação que sua família lhe deu, ou vai, sem culpa, atender, falando baixo: “Oi, tô em outra realidade! Depois te ligo!” […] (PASSÔ, Amores Surdos, 2012, p. 18-19)
“Há que ser imparcial ao voltar o olhar para uma produção artística”, reza o manual de crítica tradicional. Não obstante, na minha concepção analítica, esta característica sempre é – ou deveria ser, em nível geral, – colocada em xeque, pois, em primeiro lugar, só me proponho a discorrer sobre algum trabalho artístico pelo qual sinto algum tipo de identificação e há que se destacar que as identificações nem sempre estão no âmbito do positivo. Em segundo lugar, considero que todas as propostas espetaculares apresentam aspectos positivos e negativos que merecem ser destacados. Não vejo sentido evidenciar os aspectos negativos quando não for para favorecer ao crescimento do trabalho do grupo que está recebendo a minha leitura.
Neste sentido, falar sobre o trabalho do Espanca é um privilégio, pois a minha relação com o grupo está dentro do universo dos afetos que tanto prezo. Apesar de meu objetivo aqui ser manifestar o meu olhar crítico, não me privo de destacar as minhas subjetividades pelo fato de considerar o grupo um dos coletivos favoritos dentro do contexto mineiro. Diante de seu já vasto repertório, elejo para esta breve reflexão os seus dois primeiros trabalhos, “Por Elise” e “Amores Surdos”, pois se tratam de encenações singulares que me permitem refletir sobre distintas possibilidades de leituras: os espaços intervalares da memória, os lugares de representação das identidades dos sujeitos e de suas subjetividades na contemporaneidade, o teatro pós-dramático, ecos de um realismo mágico.
A peça “Por Elise” foi escrita, em 2005, por Grace Passô, durante o processo de criação do espetáculo, em parceria com os atores Gustavo Bones, Marcelo Castro, Paulo Azevedo e Samira Ávila, sendo que esses últimos autores foram substituídos posteriormente por Sérgio Penna e Renata Cabral. Por sua vez, Amores Surdosestreia em 2006. No elenco, além da autora, Grace Passô, Gustavo Bones, Marcelo Castro, Paulo Azevedo e Samira Ávila, que foram substituídos, respectivamente, por Assis Benevenuto (que assume a personagem Joaquim, interpretada na primeira montagem por Gustavo Bones, que, por sua vez, passa a interpretar a personagem Pequeno) e Mariana Maioline, em 2009.
Em nossa contemporaneidade, muito se discute sobre teatro pós-dramático e os argumentos e proposições de Hans-Thies Lehmann. Patrice Pavis, no artigo “Teatro Pós-dramático” (2014), traça um panorama sobre o conceito, apresentando as origens, alguns problemas, desafios e encorajamentos. O crítico elenca quatro desafios, entre os quais, para esta reflexão, destaco “a heterogeneidade”:
o dramático (o textual) e o cênico (o performativo) estão claramente imbricados; daí resulta um objeto artístico e uma noção teórica (o PD) bastante heterogênea, entretanto adaptada às obras e ao mundo com o qual nos relacionamos. Nenhuma teoria dos gêneros dramáticos, e ainda menos uma teoria das práticas cênicas, seriam capazes de incluir todos esses espetáculos.
Os diferentes espetáculos (performances) do PD não se definem por uma essência ou por características comuns, mas sim por práticas cênicas e sociais radicalmente diferentes umas das outras. Não somente a representação é a soma heterogênea das artes, dos materiais, ou dos discursos, mas eles próprios são heterogêneos e não específicos […] (PAVIS, 2014, p. 16)
Julgo pertinentes as considerações de Pavis pelo fato de o crítico se mostrar consciente da imbricação, da heterogeneidade e das diferenças que se fazem presentes entre as propostas espetaculares contemporâneas. No caso dos espetáculos aqui discutidos, apesar de distintos, considero que ambas as encenações foram produzidas com referências nos argumentos expostos por Pavis, trazem elementos que dialogam entre si e, por sua vez, são estas singularidades que me interessam.
Se, em “Por Elise”, temos a figura emblemática da personagem Dona de Casa que inicia o espetáculo anunciando que “tem mil histórias para contar” e, como uma “narradora brechtiana”, abre um leque de poéticas textuais que passam a ser divididas com os espectadores; em Amores Surdos, temos a presença de Samuel, que abre o espetáculo lendo uma carta cifrada e rebuscada: “Sabeis o quanto o dia a dia encerra os nossos sentidos, desenha nossas almas no hábito e, portanto, o quanto a vida cá nessas quatro paredes não é doce, branda ou suave. […]” (p. 17), que tudo indica haver sido enviada pelos vizinhos moradores do apartamento superior com os quais a família não estabelece uma relação “amistosa”; para, em seguida, entrar em cena a personagem Joaquim, que como um contador de histórias “contemporâneo” – por que não pós-dramático? – também quebra – brechtianamente – o pacto ficcional, revelando ao espectador um dos desfechos da trama – a morte do irmão em um país estrangeiro longe da família. Assim como em “Por Elise”, sentimentos de solidão, medo, incapacidade e incomunicabilidade são evidenciados também em “Amores Surdos“.
Os sentimentos, subjetividades e as identidades fragmentadas de cada personagem são desvelados nas ações físicas e na atuação de cada ator. Em Por Elise, uma Dona de Casa, a suposta Elise, uma mulher contadora de histórias (uma griot), aquela que sabe a história de todos, mas não é capaz de lidar com a sua, que cria galinhas, mas tem dó de matá-las; um Funcionário, que se veste com uma roupa que tem uma proteção de espuma, pois trabalha lidando com cães, não se envolve com as coisas que o rodeia, junta dinheiro para ir para o Japão e tem a função de sacrificar o Cão (Homem-Cão) da personagem Mulher, uma jovem, vestida de vermelho, frágil, sensível, que tem no seu cão a única possibilidade de afeto e tem o seu caminho cruzado pelo Lixeiro, que corre o tempo todo atrás de um caminhão de lixo, imaginando que o mar é o seu horizonte, a possibilidade de fuga, de viagem, de encontros. Talvez, esta personagem represente a utopia. A presença da personagem Homem/Cão na trama é fundamental para o desenvolvimento e desenlace da obra. Se, em princípio, ela possa ser vista e interpretada apenas por um ator vestido com um moletom marrom, sua movimentação, ao longo do desenvolvimento do espetáculo, vai alternando com ações tipicamente humanas – andar sobre as duas pernas e beijar a boca das outras personagens, que traz uma forma de manifestação do afeto humano e, ao mesmo temo, remete às lambidas, que são uma demonstração de afeto dos cães. Os trejeitos trazidos para as cenas também nos remetem aos de um cachorro: os latidos (palavras/brados/poéticas textuais) próprios de um cão, brincadeiras (partituras) corporais como saltar ou bater as mãos (patas) em sua dona. Com a interpretação do Homem/Cão, Marcelo Castro assume as características de um ator-performer, aquele que Pavis se refere como ator pós-dramático:
O ator PD é um ator performador: o performador não tenta construir nem imitar um personagem, ele se situa num cruzamento de forças, dentro de um coralidade, inserido num dispositivo que agrupa o conjunto de suas ações e de suas atuações físicas. Ele se apresenta como uma simples presença da pessoa tendo subtraído o personagem, ou como numa competição de resistência vocal e física (Pollesch, Castorf). Ele não é mais obrigado a entrar nas emoções do espectador por meio da imitação ou da sugestão de suas próprias emoções (Einfühlung), mas segundo a feliz formulação de Roselt, ele deve sair da identificação (Ausfühlung), abandonando o pântano da simulação das emoções, para alcançar as suas próprias emoções, tal qual um desportista, um intérprete musical, um membro de coro, um técnico ao serviço não da imitação humana e de uma ilusão teatral, mas de um coletivo de enunciação.
Na minha leitura, o ator-performer e sua personagem atuam no limiar entre o representacional e o ficcional, jogando com uma tessitura corpórea, deixando que os espectadores se sintam envolvidos pelas poéticas textuais sugeridas por cada cena, que todos se vejam embebidos pela “ilusão teatral”.
Estas poéticas textuais se manifestam em outras partes da encenação como no momento em que o público presente – ou pelo menos parte dele – reconhece, por meio de uma reminiscência de memória, uma música que lhe é familiar: a mesma de um caminhão de gás que passava na porta da casa onde residia em um bairro da periferia de Belo Horizonte ou de uma cidade do interior das Minas Gerais, ou seja, trata-se da música “Pour Elise”, de Beethoven. Estas subjetividades se corporificam nos diálogos entre a Mulher e a Dona de Casa e, dentre tantas pérolas poéticas ditas, eclode a fala da Mulher, um jorro de melancolia: “O caminhão de gás. Que música bonita para se comprar gás chorando, não é?” (p. 53). A sequência é um dos momentos mais belos da encenação:
Mulher experimenta para si a Cerimônia das Palmas, enquanto se ouve a música ‘Pour Elise’, de um caminhão de gás que passa por ali.
Mulher procura sua força. Faz a sua Cerimônia das Palmas.
Mulher: Eu sou forte, como um cavalo novo, com fogo nas patas, correndo em direção ao mar. Eu sou forte, como um cavalo novo, com fogo nas patas, correndo em direção ao mar! Deus, eu não vou lhe incomodar. Eu juro. Pode ficar aí. É só pra ficar olhando. Eu vou me levantar daqui sozinha e vou voltar a correr porque é da Ordem. E, se for necessário, eu vou começar tudo de novo. Vou acordar de manhã, fazer o café e ligar a secretária eletrônica, o alarme, e vou colocar cacos nos muros, e olhar meu jardim e correr novamente. Porque eu sou forte, porque eu sou forte.
Ela chora. Ela chora.
Mulher: E vou criar outros instantes e ninguém vai perceber que estou criando, porque todos vão se envolver! TODOS! E que venham os fins, que venham todos os fins, porque eu sei recomeçar, eu sei! Quem respira por mim? Quem respira por mim? Porque eu sou forte, como um cavalo novo, com fogo nas patas, correndo em direção ao mar. CORRENDO EM DIREÇÃO AO MAR. CORRENDO EM DIREÇÃO AO MAR. CORRENDO EM DIREÇÃO AO MAR! (p. 54-55, maiúsculas do original).
As palavras ressoam em tom de lirismo e de prédica e desvelam um fluxo de pensamento em que a subjetividade da personagem é apresentada, em princípio, de forma desconexa, mas, em seguida vai ganhando contornos de esperança, de desejo de mudanças e, novamente, o mar é a metáfora que representa esta possibilidade de transformação.
Ao final, depois de o espectador entrar em contato com as identidades fragmentadas de todas as personagens, depois de conhecer as fragilidades dos sujeitos em seus encontros casuais e por meio de suas histórias entrecortadas, fica latente o latido-bramido do Homem-Cão, que encerra, alegoricamente e em tom didático, o espetáculo: “CUIDADO. CUIDADO COM O QUE TOCA. COM A CAPACIDADE QUE GENTE TEM DE SE ENVOLVER COM AS COISAS. COM O AMOR, QUE ESPANCA DOCE. CUIDADO. FAÇA ISSO POR MIM. POR MIM! POR MIM! POR MIM!” (p. 57, maiúsculas do original).
Os sentimentos também podem ser considerados um dos motes da dramaturgia e da encenação em Amores Surdos. O pacto estabelecido com a personagem Joaquim logo ao início da encenação, além de revelar ao espectador que o irmão, que vive em outro país, irá morrer durante a encenação, como já foi descrito, também deixa transparecer que ele é sonâmbulo e é o seu sonambulismo que passa a desvelar as subjetividades de toda a família, composta por ele, o filho mais velho, que tem uma relação mal resolvida com a Mãe; o Pai, Vicente, que é citado o tempo todo durante a encenação, mas não aparece; a Mãe, superprotetora e controladora de toda a família, carinhosa em alguns momentos e, em outros, ríspida com os filhos; Samuel, frágil e inseguro, vai começar o seu primeiro dia de trabalho, mas não se sente seguro para encarar o mundo exterior à sua casa; Graziele, uma adolescente, que usa o tempo todo um headphone que ganhou de presente do irmão que vive fora, ela “está na fase em que imagina a vida como um clipe de música (p. 23); Pequeno, tem crises de asma, recusa-se a calçar os sapatos, é apaixonado pela menina do apartamento de cima, tenta durante toda a encenação contar à família um segredo: “Mãe… Sabe naquele “quando” que eu botei gesso no braço? […] É que… Nada não… (p. 33)”; Junior, o irmão que vive em outro país, liga para casa constantemente demonstrando que se encontra extremamente solitário: “Alô, Junior? Como vai? […] mas por que está com essa voz/ Júnior! Você está chorando? Calma, o que você tem? que foi? Aconteceu alguma coisa? Aconteceu? Junior!” (p. 50), um vetor que justifica e nos permite entender depois a suposta morte anunciada pela personagem Joaquim.
A relação com Os Rinocerontes (1959), de Ionesco e um possível diálogo com a estética do absurdo tornam-se evidente na dramaturgia e na encenação de Amores Surdos. No entanto, prefiro destacar, nesta leitura, ecos do Realismo Mágico – assim como os vislumbro, em Por Elise, nos abacates que pendem e caem do teto e, poeticamente, provocam, espancam palavras doces como aquelas deixadas para o filho pela personagem Valico quando, enfartando, poetiza: “OH VIDA, FARPA DE MADEIRA INTENSA! A NATUREZA NÃO É DOCE, OS FRUOS É QUE SÃO” (p. 25, maiúsculas do original) – quando Pequeno revela à família que trouxe um hipopótamo do zoológico, que, no começo ele o colocava sua piscininha, mas o bicho cresceu e ele acabou o deixando no quarto do irmão Júnior. A sua ideia era aprender a respirar com o animal, pois os hipopótamos têm um pulmão enorme, assim ele se curaria de sua asma. Pequeno revela que William, nome que deu ao seu bicho de estimação, já vivia com a família há cinco anos e que havia comido o Pai logo quando chegou ao apartamento. Apesar de uma história “surreal” (no sentido trivial da palavra) e fantasiosa que parte de uma perspectiva de uma criança, como em uma narrativa de Gabriel García Márquez, os conflitos da família e a figura alegórica do animal se fazem críveis aos olhos do espectador. O universo do realismo mágico (maravilhoso) se configura: desprender-se da realidade por meio de uma história, em princípio “fantástica”, descrita de forma “realista” dentro de uma narrativa, neste caso, dentro das ações dramatúrgicas.
Quando é relevado que o hipopótamo engoliu o Pai, a família, que em si já era desestruturada, fica em pânico, Joaquim quer matar o animal: “SE NÃO MATARMOS, ELE VAI ENGOLIR MAIS UM DE NÓS!” (p. 62, maiúsculas do original); Graziele teme pelo irmão; Samuel, mais uma vez, volta para casa, pois não consegue sair para enfrentar o primeiro dia do trabalho e insiste tocando a campainha, chorando desesperadamente, implorando para que lhe abram a porta; a Mãe, num primeiro momento, bate no Pequeno, grita. Tudo isso acontece em um ritmo que vai crescendo ao som de uma música erudita (uma alusão à família dos vizinhos que ouvem música orquestrada muito alta, são cultos, mas não se entendem), em que eclode o sentimento de incomunicabilidade entre todos os membros da família. Até que a Mãe, finalmente, toma para si a responsabilidade:
Mãe: (digna, surpreendentemente forte) NINGUÉM VAI MATÁ-LO. ESSA É A NOSSA REALIDADE. TEM COISAS QUE NÃO SE MATA. TEM COISAS QUE FORAM FEITAS PARA SE VIVER COM ELAS. ESSA É NOSSA REALIDADE, NÃO SE ARRANCA A COLUNA POR CAUSA DA DOR NAS COSTAS, O GRANDE BICHO VAI CONTINUAR AQUI, NESSA CASA, DENTRO DE NÓS. DENTRO DE NÓS. NINGUÉM VAI MATÁ-LO. TEM COISAS QUE FORAM FEITAS PARA SE VIVER COM ELAS. TEM COISAS QUE FORAM FEITAS PARA SE VIVER COM ELAS. TEM COISAS QUE FORAM FEITAS PARA SE VIVER COM ELAS. TEM COISAS QUE FORAM FEITAS PARA SE VIVER COM ELAS. (p. 62-63, maiúsculas do original)
Assim como em Por Elise, na fala da Mãe, a repetição aqui ecoa nos sentidos do espectador e essas “COISAS QUE FORAM FEITAS PARA SE VIVER COM ELAS” assumem conotações múltiplas em nossa contemporaneidade, assim como a lama que vai “sujando” o figurino dos atores/personagens aos poucos ao longo do espetáculo e ao final toma conta de todo o palco e se converte em um macrossigno que pode ser lido a partir de distintas perspectivas: o desencontro dessa família retratada em cena, as dificuldades de relações na nossa contemporaneidade, esse “hipopótamo” que temos que “engolir” em nosso cotidiano – que cara/rosto ele representa/tem?…
A trilha sonora nos dois espetáculos é fundamental para propiciar a reflexão diante os olhos da plateia. Se, em Por Elise, a música de Beethoven aciona um memória coletiva do público; em Amores Surdos, nos minutos finais, depois de todos se enfrentarem e, pela primeira vez, se olharem verdadeiramente, a Mãe traz para a cena um balde, panos de chão e vassouras e os entrega para Graziela e Joaquim, que começam a limpar o chão, enquanto Samuel continua implorando, do lado externo do apartamento, para entrar (o lar aqui, ainda que desestruturado, como já foi explicitado, é o único lugar onde ele se sente “seguro”). É introduzida a música “Pérolas aos poucos”[1], de José Miguel Wisnik, e, nesse momento, todos tentam organizar o espaço como se fosse possível reorganizar as suas vidas. Diante do caos instaurado em cena, a personagem Pequeno cresce; talvez, o único sujeito daquela família que tem a sua identidade tocada, aquele que passa por um processo real de transformação, e o grande signo desta transformação são os sapatos.
O menino calça o seus sapatos pela primeira vez. E, calçado com os seus sapatos, faz o seu ritual de sapateado. Durante todo o espetáculo a família, simulando uma aparente harmonia realiza um ritual de café-da-manhã ao som de uma música, onde a Mãe e os filhos Samuel, Joaquim e Graziele dançam sapateado enquanto Pequeno toca o seu piano de calda construído com o seu jogo de peças de montagem de madeira. A Mãe grita pelo pai Vicente, chamando para unir-se à família para o ritual do café da manhã. Tudo isso revela a potência do ato final da personagem ao calçar os sapatos e realizar o seu solo de sapateado .
Por fim, ao final da encenação, o telefone toca e Pequeno se dirige à plateia dizendo: “Vocês, por favor, já podem ligar seus celulares. Alguém pode estar chamando por vocês, e isso é muito importante.” (p. 64) O telefone toca insistentemente… As palavras-“oráculo” de Joaquim se cumpririam?…
REFERÊNCIAS
PASSÔ, Grace. Amores Surdos. Rio de Janeiro: Cobogó, 2012
PASSÔ, Grace. Por Elise. Rio de Janeiro: Cobogó, 2012
PAVIS, Patrice. Teatro Pós-dramático. In: BAUMGÄRTEL, Stephan e CARREIRA, André. Nas fronteiras do Representacional: reflexões a partir do termo “Teatro Pós-Dramático”. Florianópolis: Letras Contemporâneas, 2014. p. 9-23.
[1] Eu jogo pérolas aos poucos ao mar/ Eu quero ver as ondas se quebrar/ Eu jogo pérolas pro céu/ Pra quem pra você pra ninguém/ Que vão cair na lama de onde vêm// Eu jogo ao fogo todo o meu sonhar/ E o cego amor entrego ao deus dará/ Solto nas notas da canção/ Aberta a qualquer coração/ Eu jogo pérolas ao céu e ao chão// Grão de areia/ O sol se desfaz na concha escura/ Lua cheia/ O tempo se apura/ Maré cheia/ A doença traz a dor e a cura/ E semeia/ Grãos de resplendor/ Na loucura// [eu jogo ao fogo todo o meu sonhar/ eu quero ver o fogo se queimar/ e até no breu reconhecer/ a flor que o acaso nos dá/ eu jogo pérolas ao deus dará]
MARCOS ALEXANDRE é doutor em Letras pela FALE-UFMG, bolsista do CNPq e professor Associado da FALE-UFMG, na graduação e na pós-graduação.
Direção e Dramaturgia: Grace Passô
Atores: Grace Passô (Dona de Casa), Gustavo Bones (Lixeiro), Marcelo Castro (Homem), Renata Cabral (Mulher) e Sérgio Penna (Funcionário)
Atores da Primeira Formação: Paulo Azevedo (Funcionário) e Samira Ávila (Mulher)
Figurino: Marco Paulo Rolla
Iluminação: Telma Fernandes
Trilha Sonora: Daniel Mendonça
Vocal: Le Thi Bich Huong
Contribuição Artística: Rita Clemente
Técnico e Operador de Luz: Edimar Pinto
Assessoria Vocal: Camila Jorge e Mariana Brant
Instrutora de Tai Chi: Aline Midori
Costureiros: Mércia Louzeiro e José Martins
Cenotécnicos: Helvécio Isabel e Neném
Produção: Aline Vila Real
Realização: espanca!
Classificação: 12 anos
Duração: 60 minutos
Por Elise estreou dia 22 de março de 2005, no Teatro José Maria Santos, em Curitiba, Paraná.
2016
Setembro
– Conexões Teatrais (12 anos do grupo Espanca!) – SESC Palldium. Belo Horizonte, MG.
2015
Maio
– curta temporada no teatro do SESC Ipiranga – Mostra Espanca! 10 anos. São Paulo, SP.
Fevereiro
– Feverestival (Festival Internacional de Teatro de Campinas) – Teatro Castro Mendes. Campinas, SP.
2014
Julho
– Espanca! 10 anos – temporada no CCBB-BH. Belo Horizonte, MG.
Janeiro
– K-iau em Cena – Festival Nacional de Teatro – Centro Cultural Luz da Lua. Araçuaí, MG.
2013
Setembro
– Festival Internacional de Teatro de Dourados – teatro Municipal de Dourados, MS.
Julho
– Festival de Inverno de Garanhuns – teatro Luiz Souto Dourado. Garanhuns, PE.
2012
Dezembro
– temporada no Teatro Ipanema – projeto “espanca! Temporada RJ”. Rio de Janeiro, RJ.
2011
Novembro
– Festival de Teatro de Ribeirão Preto – teatro Municipal. Ribeirão Preto, SP.
Julho
– Festival de Inverno de Ouro Preto e Mariana – Fórum das Artes. Teatro SESI-Mariana, MG.
Maio/Junho
– espanca! em cartaz – temporada no Teatro do Oi Futuro. Belo Horizonte, MG.
2010
Agosto
– Festival de Teatro de Fortaleza – Theatro José de Alencar. Fortaleza, CE.
2009
Setembro
– espanca! à Mostra – Teatro do Oi Futuro. Belo Horizonte, MG.
Agosto
– Teatro em Movimento – Teatro SESI. Contagem, MG.
– Teatro em Movimento – Teatro Zélia Olguin. Ipatinga, MG.
2008
Novembro
– Festival Internacional de Artes Cênicas da Bahia – SESC/SENAC Pelourinho. Salvador, BA.
– Festival Brasileiro de Artes Cênicas do Pará – Teatro Margarida Schivazzappa. Belém, PA.
Setembro
– Festival Nordestino de Teatro de Guaramiranga – Teatro Municipal Rachel de Queiroz. Guaramiranga, CE.
– Projeto Encenação – Dragão do Mar. Fortaleza, CE.
– Porto Alegre em Cena – Teatro de Câmara Túlio Piva. Porto Alegre, RS.
Março/Abril/Maio
– Viagem Teatral SESI-SP – Santo André, Mauá, Santos, Birigui, Marília, Araraquara, Franca, Rio Claro, Piracicaba, Itapetininga, Sorocaba e Osasco.
– Teatro Municipal de Sertãozinho, SP.
2007
Novembro
– Cabeça, Tronco e Membro(s) – Diálogos Cênicos Nacionais – Espaço Parlapatões. São Paulo, SP.
Outubro
– Centro Cultural Humberto Mauro – Circulação Telemig Celular-CEMIG – Cataguases, MG.
Agosto/Setembro
– Temporada Teatro dos Quatro – Circulação Telemig Celular-CEMIG – Rio de Janeiro, RJ.
Agosto
– FENTEPP – Festival Nacional de Teatro de Presidente Prudente, SP.
Julho
– Festival de Inverno de Campina Grande – Teatro Municipal Severino Cabral. Campina Grande, PB.
– Sala Apollo – Circulação Telemig Celular-CEMIG – Recife, PE.
– Teatro SESI Armando Monteiro – Circulação Telemig Celular-CEMIG – João Pessoa, PB.
– Festival de Inverno de Congonhas, MG.
– Inverno Cultural – São João Del Rey, MG.
Junho
– Teatro Sesi Minas, Circulação Telemig Celular-CEMIG – Uberaba, MG.
Abril
– Acto1! encontro de teatro – Teatro Dom Silvério (Chevrolet Hall) – Belo Horizonte, MG.
Fevereiro
– Festival Brasileiro de Teatro de Itajaí – Teatro Municipal. Itajaí, SC.
Janeiro
– Campanha de Popularização do Teatro e da Dança – Temporada no Teatro Dom Silvério (Chevrolet Hall) – Belo Horizonte, MG.
2006
Novembro
– Curta temporada no Teatro Dom Silvério (Chevrolet Hall) – Belo Horizonte, MG.
– Mostra “BH Mostra BH”, Teatro Dom Silvério (Chevrolet Hall) – Belo Horizonte, MG.
– Agenda Cultural – Auditório Fernando Oliveira Silva – Ouro Branco, MG.
– Teatro Solar, Circulação Telemig Celular-CEMIG – Juiz de Fora, MG.
Outubro
– Programação Usicultura – Teatro do Centro Cultural Usiminas – Ipatinga, MG.
– Outubro do Teatro – João Pessoa, PB.
Setembro
– Curta temporada no SESC Pompéia – São Paulo, SP.
– Festival Rota Cultural MBR – Teatro Municipal Manoel Franzen de Lima. Nova Lima, MG.
– Cena Contemporânea – Centro Cultural Banco do Brasil. Brasília, DF.
Julho/Agosto
– Curta temporada no Teatro da Caixa – Curitiba, PR.
– Mostra Nacional de Teatro de Uberlândia. Teatro Rondon Pacheco. Uberlândia, MG.
– FIT – Festival Internacional de Teatro Palco e Rua – Teatro Klauss Vianna. Belo Horizonte, MG.
Junho
– Copa da Cultura – Festival Brasil em Cena – Hebbeltheater – Hau. Berlim, Alemanha.
Maio
– Mostra de Referências Teatrais – Galpão das Artes. Suzano, SP.
– Espaço Cultural CPFL – Campinas, SP.
Janeiro
– Campanha de Popularização do Teatro e da Dança – Temporada no Teatro Marília – BH, MG.
2005
Novembro
– Lançamento do livro “Por Elise” – Teatro Klauss Vianna – Belo Horizonte, MG.
– Curta temporada no Teatro Klauss Vianna – Belo Horizonte, MG.
– Festival Recife do Teatro Nacional. Teatro Barreto Júnior, PE.
Outubro
– Encontro SESI de Artes Cênicas – Araxá, MG.
– RioCenaContemporânea – Sala Baden Powell. Rio de Janeiro, RJ.
– Experimento Cênico – SESC Araraquara, SP.
Setembro
– Temporada no SESC Belenzinho – São Paulo, SP.
Agosto
– Reinauguração Teatro Marília – Belo Horizonte, MG.
Julho
– Festival de Inverno de Itabira, MG.
– Festival de Inverno de Ouro Preto – Fórum das Artes, MG.
– Festival Internacional de Teatro de São José do Rio Preto, SP.
Junho
– FILO – Festival Internacional de Londrina – Teatro FILO. Londrina, PR.
Maio
– Curta temporada no SESC Pompéia – São Paulo, SP.
– Temporada no Galpão Cine Horto – Belo Horizonte, MG.
Março
– Estréia nacional – Festival de Teatro de Curitiba – Fringe – Teatro José Maria Santos. Curitiba, PR.
PRÊMIOS:
– Vencedor do Prêmio SESC-SATED/MG – Edição Comemorativa (2006) – Melhor texto
– Vencedor do Prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) de melhor texto teatral 2005.
– Vencedor do Prêmio Shell – edição São Paulo – Melhor Dramaturgia 2005.
– Vencedor do Prêmio SESC-SATED/MG – Melhor Espetáculo 2005.
– Vencedor do Prêmio SESC SATED/MG – Melhor texto 2005.
– O grupo Espanca! foi indicado ao Prêmio Shell 2005 – edição São Paulo – na Categoria Especial, pela criação e concepção do espetáculo “Por Elise”.
– Indicado a melhor atriz (Grace Passô) e trilha sonora no prêmio SESC-SATED/MG 2005.
– Indicado a melhor espetáculo adulto, texto inédito e atriz coadjuvante (Samira Ávila) no Prêmio Usiminas-Sinparc/ MG 2005.
– Indicado em 2005 pela Revista Bravo! como um dos 100 melhores espetáculos de artes cênicas produzidos nos últimos oito anos no Brasil (67ª colocação).