fala do Célio Gari (Rio) no encontro da Cidade Que Queremos (BH)

Nós somos agentes de saúde ambiental. Nós temos uma responsabilidade e uma importância enquanto trabalhadores da limpeza urbana. Nós preferimos que a cidade não venha a ficar doente. Não é pelo grau de instrução, mas pela atividade fim que nós exercemos, que temos que ter um melhor salário. O que adianta você limpar uma cidade se você não tem acesso a um teatro? O que adianta você limpar uma cidade se você não tem acesso à cultura? O que adianta você limpar a cidade e não ter uma vida social digna com a sua família? Nós somos importante pra cidade. Não somos apenas aqueles trabalhadores catadores de lixo, nós somos importantes sim e podemos contribuir muito pra cidade.

O movimento de greve teve um grande avanço: começar a discutir e debater política.

A maior parte dos trabalhadores da COMLURB são negros e moram em comunidades.

O que nos fez fazer esse levante em 2014-2015 foi Junho. Junho foi o grande incentivador pra que nossa categoria pudesse continuar avançando e discutindo política.

Eles [governo e empresários] tem atuado em conjunto, em rede. E nós também, enquanto cidadãos, estamos atuando em conjunto, em rede, e buscando soluções. E eu vejo que as soluções somos nós, nós que temos que lutar por nós mesmos. Se nós dependermos dessas velhas estruturas que estão aí, nós vamos ficar perdidos, vamos ficar amarrados nas mãos desses caras. O que vai fazer a diferença é isso: nós irmos pras ruas reivindicar nossos direitos (…). Tem uma grande tendência das cidades se organizarem contra essas arbitrariedades. Quem pode fazer isso somos nós.

Temos o Círculo de Cidadania, Círculo Laranja, que é horizontal, e lá temos um grande aprendizado. Lá tem um Círculo de Saúde, Círculo de Educação, que coloca as questões: por exemplo, o uniforme do gari só deixa de ser infectado após 5 anos, algo que a gente não sabia. Lá nós começamos a compreender que nós não somos apenas gari (não somos esse sobrenome, do francês), que nós somos agentes de saúde ambiental. Nós começamos a perceber a nossa responsabilidade e a nossa importância enquanto trabalhadores da limpeza urbana, que nós preferimos que a cidade não venha a ficar doente. Não é pelo grau de instrução, mas pela atividade fim que nós exercemos, que temos que ter um melhor salário. O que adianta você limpar uma cidade se vc não tem acesso a um teatro? O que adianta você limpar uma cidade se vc não tem acesso à cultura? O que adianta você limpar a cidade e não ter uma vida social digna com a sua família? Começamos a perceber e descobrir que nós somos importante pra cidade. Nós não somos apenas aqueles trabalhadores catadores de lixo, que nós somos importantes sim e podemos contribuir muito pra cidade.

A prefeitura terceiriza a mão de obra para o capital, onde os empresários vão ganhar muito lucro, esses funcionários ganham muito pouco, não se abre concurso e vai entregando, vai sucateando, vai exterminando esses trabalhadores até acabar e privatizar todos os órgãos públicos! No Rio de Janeiro, dentro da COMLURB, entregaram os caminhões pra [transportadora] Júlio Simões, os lixões são controlados pelos capitalistas, os motoristas são terceirizados, eles agora estão num processo de automação (pra poder enfraquecer a luta). Nós entendemos que a automação é importante pra cidade, mas ela não serve pra demitir trabalhadores que foram concursados. Esses trabalhadores tem que ser requalificados e trabalhar em outros setores (como parques, bosques, jardins, limpeza de rios…) Eles estão tentando precarizar nosso serviço pra entregar na mão do capital.

No Porto Maravilha, do Eike Batista e seu consórcio lá, descaracterizaram o uniforme do trabalhador (de laranja pra azul). Lá esse trabalhador fica vulnerável, tem o maior índice de acidente, se coloca o logotipo do consórcio, descaracterizando a limpeza urbana.

O que nós temos que fazer é destruir essa casta. Nós que temos que se fazer representar (…) Eles chegam ali quer destruir uma praça, não consulta a cidade. Querem remover uma comunidade e não consulta a cidade. Como assim, remover moradores a troco do capital? Qual o legado que a Olimpíada vai deixar pro Rio de Janeiro? O legado da destruição, do trauma que tá ocorrendo dentro das comunidades. Eu aprendi isso no Círculo de Cidadania, no Círculo Laranja, os moradores de comunidades que estão sendo removidas, essas pessoas estão morrendo! Tem comunidade com promessa de remoção, como no Horto, vários idosos morreram, porque perderam a esperança, sabem que aquilo ali não é deles! Que qualquer hora vai dizimar eles! Na Vila Autódromo, uma senhora de idade, toda ensanguentada, imagina o trauma que essa senhora vai ter pro resto da vida dela, seus parentes! A saúde dessas pessoas fica totalmente debilitada! É o terror do Estado colocado dentro das nossas comunidades. Imagina aqui, essas pessoas do Izidiro, das comunidades que tem aqui, sabendo que amanhã vai ser removida! Olha o trauma! Como que a saúde dessas pessoas fica abalada! E o governo, de forma arbitrária, faz com que essas pessoas sofram e tenham essas sequelas pro resto das suas vidas. Nós, enquanto cidade, não podemos permitir isso! Nós temos que estar aliados a essas pessoas menos favorecidas. Nós não podemos deixar que eles tentem tirar nossos direitos. E nós, garis, vamos continuar lutando sim!